sábado, 22 de março de 2008

A escrota



Porto Velho é uma cidade escrota. Quase todo mundo do Sul e Sudeste acha que ela fica em Roraima (RR), como os telejornais gostam de citar, em casos de lapso. Eu morro de rir quando vejo um William Bonner (Jornal Nacional/Rede Globo) ou Carlos Nascimento (Brasil Urgente/SBT) se referirem errado a capital de RONDÔNIA (RO), mas, enfim, apesar de ver a revolta de quem nasceu aqui ao deparar com um erro grotesco dessa natureza, tenho que escrever obrigatoriamente que Porto Velho é uma cidade escrota.
A capital centraliza a sua economia no salário do funcionalismo público e diante da sua fauna habitacional existe um abismo gigantesco entre a elite e a marginália, como ocorre em grandes centros, mas o diferencial e que essa dualidade social vive próxima demais, por isso mesmo o índice de violência é surpreendente - que o diga a zona Leste da cidade, o perímetro mais violento da região.
A olho nu a visão romântica que posso tirar de morar há mais de trinta anos aqui é a praticidade de alguns prazeres de consumo da cultura pop - leia-se revistas (Histórias em Quadrinhos, é claro), livros, cinema, CDs e amigos bem particulares.
Se encontro quase tudo que necessito para o meu deleite de colecionador de "gibis" na Revistaria Central, posso ater o meu consumo literário com um livraria no Aeroporto, onde lançamentos recentes se misturam a coletâneas. Como "rato" de sebo, ainda posso recorrer à Central, onde tem um sebo de livros, DVDs e CDs muito, muito interessante.
Até a chegada dos dois shopping centers monstruosos que devem ser inaugurados até o fim desse ano, dá para se contentar com os dois únicos cinemas da cidade, o Cine Rio e o Cine Veneza. Quebra um galho, mas nada de extraordinário. A programação de filmes ainda é muito infeliz. Apenas blockbusters, comédias, infantis e outro tanto de filmes românticos.
Mas o interessante é o universo de perdição que pode ser encontrado na cidade. Se de um lado você pode vislumbrar a fascinante história da lendária Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, onde há uma guerra velada entre os cultuadores da velha "maria-fumaça" e o modernos restauradores de patrimônio, de outro o ar moderno está em uma grande concentração de veículos e o inchaço da população na parte central, ainda que a cada ano surja invasões que se transformam em novos bairros periféricos.
Ah sim, tem as usinas do rio Madeira, que devem elevar o nível de vida da capital. "O horror, o horror", como diria o personagem de Marlon Brandon no filme "Apocalypse Now", de Francis Ford Copolla. Elevar no caso seria aumentar os problemas corriqueiros de intolerância social entre a marginália e a elite, para um nível desproporcional e ainda sem medição perspecto-futura. Só vivendo no tempo certo saberemos o que de fato significa uma cidade cercada por usinas e shopping centers.
A olho nu, vejo que estaremos na rota do consumo empresarial e na medição lucrativa das médias e grandes corporações, que enxergarão em Porto Velho como um novo e renovado Eldorado.
Para mim, como jornalista e consumidor ativo de cultura pop, creio que teremos anos de grande revolução. Se será positiva, definitivamente só o tempo poderá esclarecer.
Mas que Porto Velho é uma cidade escrota, ah, isso é sim.

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