terça-feira, 7 de outubro de 2008

A sombra recai sobre o esquecimento enquanto os lobos devoram...



Cansado, caminhas sobre a areia branca, em algum lugar do deserto praiano do litoral Pacífico. Um vento com cheiro de mar e a água revolta quebrando nas pedras. Um sorriso, falsa saudade.

Ela teceu a linha imaginária descendo um dedo anelar sobre o meu peito nu e citou Sartre para me dar ciência da sua pureza: "Um amor, uma carreira, uma revolução: outras tantas coisas que se começam sem saber como acabarão."

Como loba faminta ela me escolta sobre a areia morna no fim de tarde, quando o Sol se vai à Oeste, e lambe as feridas dos meus pés. Senta então ao meu lado e propõe um pensamento etéreo sobre o fim das coisas.

É leseira ressarcir o tempo perdido na colhida da introspecção, quando se está velho e depara com a realidade da vida, tão inatingível pelas lembranças agradáveis. Como o sorriso do retrato e o teu anelar circundando um dos meus mamilos enquanto me encaras com preguiça.

As nuvens carregadas cruzam o céu, cobrem o horizonte, ao longe da linha do mar. Com um olho fechado e outro aberto a visão persegue a ilusão ótica de tudo em volta e parece que está tão perto e ao mesmo tempo inalcançável a sombra que recai o esquecimento.

Um rosto estoura em flashes, indo e vindo. Os olhos fechados, a boca trêmula e um adeus sentido, cheio de rancor e amor doloroso. A partida não escolhe personagens e nada posso fazer a não ser sobreviver. Recolho a paixão e inibo a saudade, ainda que uma fresta de pensamento me persiga por memórias bêbadas.

Aos poucos tudo escurece e fachos amenos trespassam as nuvens negras que anunciam a tempestade no horizonte. A areia sob os meus pés esfriam e o vento bate com mais força. Meus cabelos balançam e os lábios ressecam rapidamente, me junto então ao meu animal imaginário, afago sua cabeça e continuo a minha caminhada solitária.

Deixo para trás os rastros na areia e caminho sossegado enquanto aguardo os primeiros pingos da chuva, sem temer o futuro que me aguarda, ainda que a sombra me persiga e deixe espaço para que me torne presa indefesa enquanto os lobos me devoram...

Para tudo se tem um reinício... Até a despedida.
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“O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.” – Jean Paul Sartre