quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

NO DELICIOSO SABOR DO DESEJO PECAMINOSO


00h23 – É uma madrugada de domingo, sim, daquela que surge depois da meia-noite de sábado. O MP3 do carro está no volume médio e ouço "Chico Buarque Song's", da extinta banda paulistana Fellini enquanto Ana Paula (nome fictício, que eu não sou doido em escrever o verdadeiro, mesmo porque ela é um doce pessoa e não gostaria de perder a sua amizade) sorri e me conta do seu projeto viajar para São Paulo daqui alguns meses, visitar a família.

Sua voz é rouca e metida em câmera lenta, com uma fonética torpe deliciosa. Os densos cabelos escuros e longos esvoaçam com o vento que entra pela janela do carro enquanto corro pela avenida que segue pelo Espaço Alternativo, rumo ao aeroporto. No ar o inebriante perfume de jasmim impregna minhas narinas enquanto finjo que não devo me apaixonar por ela.

Uma hora antes eu a apanhei na casa da sua tia. Próximo ao centro da cidade, só ela estava acordada. Abriu a porta e me pediu pra entrar e aguardar enquanto lentamente se arrumaria. Estava envolta em uma toalha amarela (bem gema de ovo), com o cabelo amarrado e sua tez morena permeada por gotículas que refletiam flashes da iluminação do abajur sobre uma estante na sala de estar.

Ela se virou de uma vez então e abriu a toalha. Estava nua. Dei um sorriso sem graça e a penugem na minha nuca arrepiou. Os olhos castanhos claros dela brilharam e fui até a cozinha.

"Tem vinho?", perguntei. Ela deu uma gargalhada vibrante. "Sim, deixei meia garrafa aí na porta da geladeira. Tinto e seco viu!", ela me advertiu.

Ela abaixou então o tom da sua gargalhada, voltou a enrolar a toalha e se aproximou de mim. "Eu te amo, sabia?", me disse olhando com carinho.

"Eu também, muito. Se não fóssemos tão amigos eu juro que te carregava no colo..."

"... e me fazia mulher?", completou Paulinha com uma interrogação.

Não respondi, abri a geladeira e peguei o vinho. Fui até a prateleira pra pegar uma taça e ela se aproximou pelas minhas costas. Abraçou-me com candura e encostou a sua cabeça no meu ombro esquerdo, senti um calor inesperado que tomou conta do meu corpo e senti um tremor estranhíssimo na pélvis.

Pensei: "Não, por favor, não faça isso". Enchi o copo com o vinho e ela delicadamente virou o meu rosto em sua direção. Funguei um pouco, ajeitei o meu óculos e fiquei bobamente com o copo na mão, enquanto ela subia suas mãos em volta do meu pescoço, sua boca estava úmida, os olhos brilhantes.

"Como isso pode acontecer?", ela sussurrou olhando diretamente para os meus olhos.

Não consegui falar nada, deixei o copo de lado então e a abracei. Ela abriu levemente a boca e senti o perfume de menta. Sorri como uma criança e deixei meus lábios grudarem em sua boca. Ela abriu caminho entre os meus dentes e enfiou levemente a língua. Propositalmente ela deixou cair a toalha e sentir o seu corpo comprimido no meu.

Ela saiu da minha boca e desceu sua língua do lóbulo da minha orelha passando pelo meu pescoço e mordiscando com suavidade o meu queixo.

"Por que? O que está havendo?", questionou ela, com os olhos semi-cerrados e a boca ainda mais úmida e quente.

Minhas mãos passearam pela suas costas e cravei os meus dedos na sua cintura, a cada mordida ou carinho mais latente sobre o meu rosto, as minhas mãos buscavam desbravar terreno antes considerado proibido, afinal somos amigos. Ela suspirou alto e já estava tirando minha camisa.

"Não sei... Não sei.", falei com dificuldade já com a boca em um de seus seios e Paulinha se atracando sobre mim.

Ela então me puxou para cima, na direção de seu quarto, em um silêncio que me parecia sepulcral, dramático. Sentia tesão e medo. Prazer e choque. A dualidade de sentimentos que imprimia uma dor fina que se apossava do meu estômago. Era um incômodo que eu não sentia desde a adolescência. Sabia, que de alguma forma estaria fazendo uma merda completa.

Quando ela deitou sobre sua cama nua já senti que estaria fazendo algo errado. Ainda assim cobri minha consciência com um manto de pecado tentador, expandindo minha libido através de um desejo secreto e que sempre reprimi por respeito, mas agora a voz em minha cabeça ficava ditando um mantra: "Foda-se, foda-se, foda-se... e é muito foda!"

Ela estava linda, como sempre esteve desde o dia em que a conheci. Tirei a minha roupa e fiquei longos minutos olhando-a com um desejo sem par. Ela era só sorrisos e não precisou mais do que isso para que eu a cobrisse com beijos. Línguas que passeavam sobre a pele e mãos, dedos que manuseavam e amaciavam carne. Fluidos se espalhavam e desejos, instintos, que tiravam nossos sentidos.

Deitei sobre a cama e ela sentou sobre a minha pélvis, brincando com a minha expectativa e roçando sua vagina sobre a minha coxa esquerda e deslizando até meu pênis. A sua boca, umedecida pela língua saliente, brilhava com a luz do abajur. Os cabelos caíam sobre os ombros e eu segurava suas nádegas, massageando e apertando com ardor a carne macia. Ela ofegava e havia um incrível odor de sexo e almíscar no ambiente. Podia sentir os seus poros salientes, os pelos arrepiados enquanto se movimentava com cadência sobre o meu corpo. Eu correspondia seus movimentos introduzindo com vigor, estocando no tempo certo, como tivéssemos feito isso antes e não pela primeira vez.

Ela virou sobre a cama e me armei em cima dela. Beijei seus lábios e deslizei meu rosto pelo seu pescoço e fiz uma trama de toques deslizando minha língua entre os seios e depois passei de um mamilo a outro, mordiscando os bicos e sugando com delicadeza. Depois desci meu corpo e a língua, sinuosa, descia pela barriga. Comprimi meus lábios no umbigo e ela segurava minha cabeça e acariciava meus cabelos. Em dado momento ela empurrou minha cabeça pra baixo e senti seus pelos pubianos na minha boca. Cheiro, fluido, intensidade na minha respiração e ela ofegante.

Comprimi meus lábios em seus pequenos lábios e não resistindo a eletricidade que a libido me provocava suguei sua vagina como se chupasse uma laranja aberta. Colhendo o sumo, duelando minha língua com seu clitóris e ficando longos segundos, longos minutos, tempo longínquo o suficiente para que eu sentisse todo o tesão de seu corpo quente, febril, esfregando com gosto seu sexo na minha boca.

Em dado momento ela me pedi para cobri-la. Me posicionei de lado e ela encostou suas nádegas na minha pélvis. Levantei uma de suas pernas e ela colou no meu corpo de costa pra mim e a penetrei. Em um tempo sem qualquer noção de medir, ficamos colados e se movimentando. Tínhamos uma combinação exata do instinto que nos transformava em um só organismo lacivo, erótico e sexual. Respiração ofegante, quase dava para ouvir uma música que cadenciava nossos movimentos. Podia ver com tanto tesão o corpo dela moreno suado, a pele macia, porém com os músculos retesados nos pontos certo. Ela conseguia comprimir o meu pênis com os músculos vaginais em movimentos rotacionais e era tudo tão intenso, quente, escroto. Não havia muito o que falar, mas fazer, fazer... Foder com vontade, com gosto até o momento em que explodi e ela soltou um grito profundo. Pediu para que eu permanecesse dentro dela enquanto gozava. Eu podia vê-la comprimindo os lábios e mexendo somente a cintura num movimento lento que ia gradualmente parando.

Havia um brilho na troca de olhares enquanto ofegava. Olhou bem nos meus olhos e deu um sorriso lindo.

Desci do seu quarto respirando ofegante, abotoando a camisa e tentando desviar das estrelas que teimavam em ficar na minha frente. Tomei o copo de vinho, que já estava na temperatura ambiente.

Ela desceu depois vestida informalmente, de top, uma jaquetazinha e calça jeans. Trazia a tira-colo uma mochila pequena.

"E a sua tia?", perguntei. "Só agora que você se preocupa com isso? Ah, ela saiu com algumas amigas", justificou.

Balancei a cabeça rindo e ela fez charme com um sorriso maroto. "Vamos? Se não a gente chega atrasado", falei.

00h33 – Chegamos ao aeroporto e desliguei o aparelho. Ela saltou do carro e a acompanhei. O avião havia chegado há 10 minutos. Ela saiu na frente e o local estava bem cheio. Eu fiquei de longe vendo o seu jeito, aflita, procurando alguém. Ela então olhou pra mim e fez um sinal de positivo. Quase gritando: "Tá aqui."

Dei um aceno de satisfação e fiquei olhando.

Ela parece que o localizou. Correu até ele e o abraçou, João, que retribuiu o abraço e a beijou intensamente. Rodopiou com ela no saguão e pareciam realmente apaixonados.

Aproximei-me lentamente e ele me viu. Abriu um largo sorriso e veio me abraçar. "E aí Marcão!".

"Tudo bem primo, só faltava você chegar mesmo. Essa moça quase me mata de tédio só falando em você nesses dez dias que esteve fora, sabia?", brinquei com ele.

"Mas você cuidou do meu amorzinho direitinho né? A mãe dos meus filhos."

Nada disse, apenas o abracei afetuosamente e fiquei admirando o semblante de felicidade de Ana Paula, que parecia uma menina, olhando para nós dois. Continuo fingindo que eu não devo me apaixonar por ela.

Não sei por que, mas me senti uma referência cinematográfica naquele momento ao lembrar de “Jules e Jim – Uma mulher para Dois” (Jules et Jim/1962), de François Truffaut.


"Caibo em qualquer fantasia./ sou fetiche para o desejo/ mais louco./ fragmento meu corpo/ pra entrar no seu espaço de querer." – Nilza Menezes, "Princesas Desencantadas ou A história das mulheres que ousaram sonhar" – 1996.

3 comentários:

Eliane disse...

Minuciosamente prazeroso. Mais uma incursão ao fantástico universo do Marcos. Adorei, o parabenizo e agradeço por proporcionar tão deliciosa leitura.

Carla M. disse...

Você me inspira, tem uma escrita encantadora. Eu amo isso.
Te adoro e te admiro demais.
Um beijo no seu coração.

Dandara Simão disse...

O que eu amo é a maneira como o sentimento flui através das palavras. Poucos sabem como o fazer. Foi uma leitura dessas você só cai em si no final.
Lindíssimo, meu amigo!