Parti sem pelo menos uma última vez ver o teu rosto
Uma mensagem a cada postagem. Um ser racional em conflito com a natureza aflitiva de querer viver, conhecer e se aventurar. É um mundo cruel, uma vida rápida, amigos passageiros e os filhos crescendo. Transmixxx - uma união de conceitos que pode representar nada ou alguma coisa. Quem decide essa dúvida? Eu mesmo. Leia e curta, é só o que peço.
sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
Parti...
Parti sem pelo menos uma última vez ver o teu rosto
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
NO DELICIOSO SABOR DO DESEJO PECAMINOSO

00h23 – É uma madrugada de domingo, sim, daquela que surge depois da meia-noite de sábado. O MP3 do carro está no volume médio e ouço "Chico Buarque Song's", da extinta banda paulistana Fellini enquanto Ana Paula (nome fictício, que eu não sou doido em escrever o verdadeiro, mesmo porque ela é um doce pessoa e não gostaria de perder a sua amizade) sorri e me conta do seu projeto viajar para São Paulo daqui alguns meses, visitar a família.
Sua voz é rouca e metida em câmera lenta, com uma fonética torpe deliciosa. Os densos cabelos escuros e longos esvoaçam com o vento que entra pela janela do carro enquanto corro pela avenida que segue pelo Espaço Alternativo, rumo ao aeroporto. No ar o inebriante perfume de jasmim impregna minhas narinas enquanto finjo que não devo me apaixonar por ela.
Uma hora antes eu a apanhei na casa da sua tia. Próximo ao centro da cidade, só ela estava acordada. Abriu a porta e me pediu pra entrar e aguardar enquanto lentamente se arrumaria. Estava envolta em uma toalha amarela (bem gema de ovo), com o cabelo amarrado e sua tez morena permeada por gotículas que refletiam flashes da iluminação do abajur sobre uma estante na sala de estar.
Ela se virou de uma vez então e abriu a toalha. Estava nua. Dei um sorriso sem graça e a penugem na minha nuca arrepiou. Os olhos castanhos claros dela brilharam e fui até a cozinha.
"Tem vinho?", perguntei. Ela deu uma gargalhada vibrante. "Sim, deixei meia garrafa aí na porta da geladeira. Tinto e seco viu!", ela me advertiu.
Ela abaixou então o tom da sua gargalhada, voltou a enrolar a toalha e se aproximou de mim. "Eu te amo, sabia?", me disse olhando com carinho.
"Eu também, muito. Se não fóssemos tão amigos eu juro que te carregava no colo..."
"... e me fazia mulher?", completou Paulinha com uma interrogação.
Não respondi, abri a geladeira e peguei o vinho. Fui até a prateleira pra pegar uma taça e ela se aproximou pelas minhas costas. Abraçou-me com candura e encostou a sua cabeça no meu ombro esquerdo, senti um calor inesperado que tomou conta do meu corpo e senti um tremor estranhíssimo na pélvis.
Pensei: "Não, por favor, não faça isso". Enchi o copo com o vinho e ela delicadamente virou o meu rosto em sua direção. Funguei um pouco, ajeitei o meu óculos e fiquei bobamente com o copo na mão, enquanto ela subia suas mãos em volta do meu pescoço, sua boca estava úmida, os olhos brilhantes.
"Como isso pode acontecer?", ela sussurrou olhando diretamente para os meus olhos.
Não consegui falar nada, deixei o copo de lado então e a abracei. Ela abriu levemente a boca e senti o perfume de menta. Sorri como uma criança e deixei meus lábios grudarem em sua boca. Ela abriu caminho entre os meus dentes e enfiou levemente a língua. Propositalmente ela deixou cair a toalha e sentir o seu corpo comprimido no meu.
Ela saiu da minha boca e desceu sua língua do lóbulo da minha orelha passando pelo meu pescoço e mordiscando com suavidade o meu queixo.
"Por que? O que está havendo?", questionou ela, com os olhos semi-cerrados e a boca ainda mais úmida e quente.
Minhas mãos passearam pela suas costas e cravei os meus dedos na sua cintura, a cada mordida ou carinho mais latente sobre o meu rosto, as minhas mãos buscavam desbravar terreno antes considerado proibido, afinal somos amigos. Ela suspirou alto e já estava tirando minha camisa.
"Não sei... Não sei.", falei com dificuldade já com a boca em um de seus seios e Paulinha se atracando sobre mim.
Ela então me puxou para cima, na direção de seu quarto, em um silêncio que me parecia sepulcral, dramático. Sentia tesão e medo. Prazer e choque. A dualidade de sentimentos que imprimia uma dor fina que se apossava do meu estômago. Era um incômodo que eu não sentia desde a adolescência. Sabia, que de alguma forma estaria fazendo uma merda completa.
Quando ela deitou sobre sua cama nua já senti que estaria fazendo algo errado. Ainda assim cobri minha consciência com um manto de pecado tentador, expandindo minha libido através de um desejo secreto e que sempre reprimi por respeito, mas agora a voz em minha cabeça ficava ditando um mantra: "Foda-se, foda-se, foda-se... e é muito foda!"
Ela estava linda, como sempre esteve desde o dia em que a conheci. Tirei a minha roupa e fiquei longos minutos olhando-a com um desejo sem par. Ela era só sorrisos e não precisou mais do que isso para que eu a cobrisse com beijos. Línguas que passeavam sobre a pele e mãos, dedos que manuseavam e amaciavam carne. Fluidos se espalhavam e desejos, instintos, que tiravam nossos sentidos.
Deitei sobre a cama e ela sentou sobre a minha pélvis, brincando com a minha expectativa e roçando sua vagina sobre a minha coxa esquerda e deslizando até meu pênis. A sua boca, umedecida pela língua saliente, brilhava com a luz do abajur. Os cabelos caíam sobre os ombros e eu segurava suas nádegas, massageando e apertando com ardor a carne macia. Ela ofegava e havia um incrível odor de sexo e almíscar no ambiente. Podia sentir os seus poros salientes, os pelos arrepiados enquanto se movimentava com cadência sobre o meu corpo. Eu correspondia seus movimentos introduzindo com vigor, estocando no tempo certo, como tivéssemos feito isso antes e não pela primeira vez.
Ela virou sobre a cama e me armei em cima dela. Beijei seus lábios e deslizei meu rosto pelo seu pescoço e fiz uma trama de toques deslizando minha língua entre os seios e depois passei de um mamilo a outro, mordiscando os bicos e sugando com delicadeza. Depois desci meu corpo e a língua, sinuosa, descia pela barriga. Comprimi meus lábios no umbigo e ela segurava minha cabeça e acariciava meus cabelos. Em dado momento ela empurrou minha cabeça pra baixo e senti seus pelos pubianos na minha boca. Cheiro, fluido, intensidade na minha respiração e ela ofegante.
Comprimi meus lábios em seus pequenos lábios e não resistindo a eletricidade que a libido me provocava suguei sua vagina como se chupasse uma laranja aberta. Colhendo o sumo, duelando minha língua com seu clitóris e ficando longos segundos, longos minutos, tempo longínquo o suficiente para que eu sentisse todo o tesão de seu corpo quente, febril, esfregando com gosto seu sexo na minha boca.
Em dado momento ela me pedi para cobri-la. Me posicionei de lado e ela encostou suas nádegas na minha pélvis. Levantei uma de suas pernas e ela colou no meu corpo de costa pra mim e a penetrei. Em um tempo sem qualquer noção de medir, ficamos colados e se movimentando. Tínhamos uma combinação exata do instinto que nos transformava em um só organismo lacivo, erótico e sexual. Respiração ofegante, quase dava para ouvir uma música que cadenciava nossos movimentos. Podia ver com tanto tesão o corpo dela moreno suado, a pele macia, porém com os músculos retesados nos pontos certo. Ela conseguia comprimir o meu pênis com os músculos vaginais em movimentos rotacionais e era tudo tão intenso, quente, escroto. Não havia muito o que falar, mas fazer, fazer... Foder com vontade, com gosto até o momento em que explodi e ela soltou um grito profundo. Pediu para que eu permanecesse dentro dela enquanto gozava. Eu podia vê-la comprimindo os lábios e mexendo somente a cintura num movimento lento que ia gradualmente parando.
Havia um brilho na troca de olhares enquanto ofegava. Olhou bem nos meus olhos e deu um sorriso lindo.
Desci do seu quarto respirando ofegante, abotoando a camisa e tentando desviar das estrelas que teimavam em ficar na minha frente. Tomei o copo de vinho, que já estava na temperatura ambiente.
Ela desceu depois vestida informalmente, de top, uma jaquetazinha e calça jeans. Trazia a tira-colo uma mochila pequena.
"E a sua tia?", perguntei. "Só agora que você se preocupa com isso? Ah, ela saiu com algumas amigas", justificou.
Balancei a cabeça rindo e ela fez charme com um sorriso maroto. "Vamos? Se não a gente chega atrasado", falei.
00h33 – Chegamos ao aeroporto e desliguei o aparelho. Ela saltou do carro e a acompanhei. O avião havia chegado há 10 minutos. Ela saiu na frente e o local estava bem cheio. Eu fiquei de longe vendo o seu jeito, aflita, procurando alguém. Ela então olhou pra mim e fez um sinal de positivo. Quase gritando: "Tá aqui."
Dei um aceno de satisfação e fiquei olhando.
Ela parece que o localizou. Correu até ele e o abraçou, João, que retribuiu o abraço e a beijou intensamente. Rodopiou com ela no saguão e pareciam realmente apaixonados.
Aproximei-me lentamente e ele me viu. Abriu um largo sorriso e veio me abraçar. "E aí Marcão!".
"Tudo bem primo, só faltava você chegar mesmo. Essa moça quase me mata de tédio só falando em você nesses dez dias que esteve fora, sabia?", brinquei com ele.
"Mas você cuidou do meu amorzinho direitinho né? A mãe dos meus filhos."
Nada disse, apenas o abracei afetuosamente e fiquei admirando o semblante de felicidade de Ana Paula, que parecia uma menina, olhando para nós dois. Continuo fingindo que eu não devo me apaixonar por ela.
Não sei por que, mas me senti uma referência cinematográfica naquele momento ao lembrar de “Jules e Jim – Uma mulher para Dois” (Jules et Jim/1962), de François Truffaut.
"Caibo em qualquer fantasia./ sou fetiche para o desejo/ mais louco./ fragmento meu corpo/ pra entrar no seu espaço de querer." – Nilza Menezes, "Princesas Desencantadas ou A história das mulheres que ousaram sonhar" – 1996.
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Por um amor menos profundo que os sonhos buscam no pecado...

Em algum tempo perdido de 2002...
Descobri o lençol e com uma preguiça desmedida caminhei trôpego até a janela. Abri a cortina e senti as primeiras manhãs do sol no rosto. Meus olhos se irritaram e então compreendi que não estava só.
***
Senti a boca ressecada e me lembrei dos seus cabelos balançando em meu rosto, seguindo os movimentos do vento na beira do píer, defronte a um rio caudaloso e límpido.
Ela encostou sua cabeça no meu ombro, suspirou levemente o ar frio do final da tarde e senti cada pulsação sua como tivesse o dom de um ouvido hipersensível. Cada passo de sua dor que parecia finalmente não se conter mais. Ela fingiu um sorriso pra mim e retribui com um carinho no seu rosto, tirando os fios de cabelos da sua testa.
- Você já sentiu isso? – Perguntou.
- Senti o que?
- Essa sensação de que você tem todos os seus melhores amigos a sua volta, família e ainda assim se sentir só. – Lamentou.
- Sim, sempre... Mas...
- Isso não é ruim? Parece trazer uma melancolia que me leva a questionar se realmente ter amigos em minha volta, enquanto pareço idiota, eu os mereço.
- Olha, mas a vida é assim mesmo, são momentos, fases que passamos e que temos que vincular sentimentos contraditórios com aquilo que está ao nosso alcance. Eu penso que é porque você tem uma carência afetiva muito grande.
- Como assim contraditório? Não entendi.
- Esse paradoxo que você me passou, de estar cercada de gente que gosta de você e te faz sentir bem e, ainda assim, achar que falta algo mais que não a deixe tão só.
- Ah, nossa eu sou complicada...
- É não, é só humana demais... Eu acho que te falta um romance.
Ela sorriu pra mim e balançou a cabeça, voltando-a ao meu ombro.
- Não chego a tanto, mas um pouco de emoção mundana já resolveria o meu problema. – Disse, sem pudor nenhum, com as palavras firmes das quais só amigos de longa data se permitem segredar.
Eu olhei para ela e depois para o pôr-do-sol que criava à nossa frente, dei uma risada espontânea e ela continuou olhando o rio, compenetrada.
- Acredite em mim quando eu digo que você merece mais do que isso, vá por mim.
- Eu sei... Falei por falar, só isso.
Mais tarde estávamos no bar tomando algumas tequilas e ela se engraçou com um playboy, bem artificial. Ele pareceu se sentir atraído por ela. Correspondeu o seu sorriso e deu uma piscadela. Típico do idiota que a gente encontra aos montes nesses bares da moda. Eu olhava pra ela com certa incredulidade, mas ainda assim ela me olhava com um ar transtornado.
- Por que não? – Me questionou se referindo ao "almofadinha".
- Realmente, por que não. É bonitão, veste bem, cabelo da moda, ar blasé, deve cheirar pra caralho e tem um carro zerado estacionado em algum canto aí fora.
- Você é um idiota sabia, reduz meus flertes a observações capiciosas.
- Opa, desculpe, não tá mais aqui quem falou.
Tomei uma última dose e a vi saindo do meu ninho protetor indo direto para as garras do gavião. Eram só sorrisos, os dois. De longe ela me acenou com um polegar positivo. Algo do tipo para me avisar que ele era um cara legal.
"Bom pra ela, melhor pra ele." – Pensei.
Paguei a conta e tentei acenar um adeus pra ela. Mas me ignorou por completo, estava fumando o mesmo cigarro que ele. Fui embora.
Cheguei em casa e todos já estavam dormindo, passei no quarto dos meus filhos e os dois estavam enrolados nos lençóis, cada um em sua cama e o meu mais novo abraçado com um cachorro de pelúcia que tinha quase o seu tamanho. Vislumbrei-os por alguns minutos e me retirei para o meu quarto.
Quando estava tirando a camisa o meu celular tocou, era ela. Do outro lado da linha um soluço curto e depois uma voz embargada me pedia socorro.
Peguei o carro novamente e voltei ao bar. Ela estava na frente me esperando, com os braços cruzados, caracterizando um desamparo comovente. Desci do carro e a abracei.
- O que houve? Quase não entendi o que você falou no telefone.
Ela nada disse, só pediu para levá-la embora daquele local. Eu tinha certeza que o playboy tinha aprontado alguma com ela, mas não me deixei levar pela piedade, se ela procurava algo com ele e se deu mal, não foi a primeira vez e nem foi por falta de aviso.
No carro, já seguindo até sua casa, ela me pediu que levasse pra minha, pois não queria dormir sozinha. Achei estranho, mas não a questionei. Ela então disse:
- Ele não fez nada, eu é que não entendo minha cabeça e me vejo sempre fazendo alguma merda. Percebi que posso ser um pouco melhor comigo mesma e acho que fui grossa com você.
Passei minha mão pelo seu rosto com um carinho de pluma, medindo o gesto para não parecer tão expansivo e sorri.
Levei-a até minha casa, entramos sorrateiramente no meu quarto e liguei o ar-condicionado. Ela então sentou na minha cama e meio sem graça disse que estava com sono, mas se ela quisesse conversar, bom "tudo bem".
- Eu também quero dormir. Faz o seguinte, aja como se eu não tivesse aqui e faz tudo naturalmente.
- Ah tá, fácil dizer isso pra você que é mulher, mas eu sou homem, a coisa é um pouco mais complicada.
Ela riu baixinho e me olhou com um ar de gaiata.
- Tá com medo de mim? De que eu te seduza?
Olhamos um para a cara do outro e começamos a rir, tentando conter o barulho. "Que adorável amiga maluca é essa que eu arranjei?".
- Tem um pijama meu aí em cima da cômoda, veste ele que tá limpinho e vamos dormir. Você não existe, sabia? – Retruquei.
Ela foi até o banheiro e se trocou, quando voltou eu já estava arrumando alguns travesseiros no chão e um cobertor.
- Eu vou dormir aí no chão contigo? – Ironizou.
- Muito engraçada, muito mesmo. Não, eu é que vou dormir aqui embaixo.
- Esquece isso, vamos dormir na mesma cama, eu preciso de um amigo, de um ombro largo e muito amigo.
Nada respondi, ri da sua inflexão ao fazer a proposta e deitei, logo ela deitou do meu lado e virou-se pra mim.
- E aí, nós já nos conhecemos? – Brincou.
- Não, mas podemos dar um jeito nisso.
- Como?
Eu beijei sua testa e disse: "Boa noite!"
Ela beijou o meu rosto e retribuiu o "boa noite", em seguida apaguei a luz do quarto e me virei. Ela dormiu logo e aproveitei o momento para ligar para sua casa. Falei com o seu irmão, expliquei que ela estava comigo e como já éramos amigos ficou tudo resolvido.
Era uma situação estranha, mas eu sabia dos problemas emocionais que ela passava e não poderia abandoná-la, ainda mais depois de ter saído da clínica de desintoxicação com menos de dois dias. Antes de dormir ainda fiquei lhe olhando com admiração, era muito bonita, mas ainda assim precisava defenestrar alguns fantasmas internos para viver melhor. Eu a amava muito.
***
Após o despertar, ela já estava pronta, me olhando da porta do banheiro com um sorriso matreiro no rosto.
- Dormiu bem? – Perguntei.
- Foi o melhor sono que tive em muito tempo. Obrigada, de coração.
Fui até o seu encontro e abracei com carinho. Beijei a sua testa e depois a levei até a porta, disse que havia chamado um táxi pelo celular.
Antes de sair combinei de passar na sua casa mais tarde e ela disse então que me aguardaria, passaria o dia visitando os amigos que não via há mais de seis meses.
- Ei Marcos – me falou antes de entrar no carro – eu estou limpa de verdade viu, como eu prometi à você.
- Eu sei, eu sei..
E acenei, lhe dando um tchau.
***
Um ano depois minha amiga morreria num acidente automobilístico, com outros dois amigos de faculdade, em Cuiabá (MT), sua cidade natal. Ela voltava de uma festa e estava no banco de trás do carro.
+ Para Carla Liza Moretti (1977 – 2003)
terça-feira, 9 de fevereiro de 2010
Amigos, canções e histórias - Que se foda!

No começo do ano de 2008 encontrei minha velha camisa preta com a estampa de Joey Ramone, ela estava dentro de um baú cheio de revista velhas da Cinemin e Bizz. Era uma memorabília que eu havia guardado a sete chaves e pensei que havia perdido.
quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010
Poemeto I
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
Dicas de consumo pop: "Sexo" e "Rolling Stones"

DVD - "Sexo, mentiras e videotapes" - (Sex, lies and videotapes/1989) - Sempre escrevo e digo que todo amor perfeito tem um fim inesperado. É uma afirmação para dizer que tudo tem um fim, mas a duração é eterna até o momento do adeus. Apologia nada legal para românticos. Esse filme, escrito e dirigido por Steven Soderbergh (de "Onze homens e um segredo" e "Traficc"), foi feito quando ele tinha pouco mais de 20 anos e recebeu a Palma de Ouro em Cannes. É um filme relativamente muito barato, usa quatro atores fixos e uma trama incomum, mas incrivelmente atual. O roteiro tem um final coletivo, decidido pelos atores e que se situa mais coerente com o desenrolar da trama. Um advogado bem sucedido (Peter Gallagher) é casado com uma dona de casa (Andie Macdowell) que vive um fastio sexual por causa da monotonia, porém ele mantém um caso com a ardente cunhada (Laura San Giagomo). A rotina dele se altera com a chegada de um amigo de infância (James Spader) que resolve passar alguns dias na cidade. Ficamos sabendo então que o rapaz é impotente e grava em vídeo depoimentos de experiências sexuais de mulheres. Durante o decorrer do filme fica-se observando o fascínio que ele causa nas mulheres e o modo como as convence a prestar um depoimento. Tudo se transformar quando as duas mulheres da vida do advogado resolvem prestar o depoimento e tentam compreender a cabeça complexa daquele homem, que se diz impotente. Então exposições de traumas íntimos, rancor e mentiras são expostas em uma sucessão de clímaxes que conduz para uma virada na vida de cada um dos personagens. Esse foi o filme que me impressionou pela economia de diálogos, mas todos tão precisos e bem feitos, e as motivações intensas dos personagens. É fácil assimilar os medos, anseios e encontrar uma identificação sólida com a projeção traumática do personagem central, vivido por Spader - sua impotência tem uma razão fixa, porém pode servir de metáfora a uma série de questões pessoais. Esse foi um dos primeiros filmes a questionar e expor uma geração inquieta, que passava pelos anos 80 quase incólume pelo processo degenerativo da acomodação e do egoísmo emocional. O romance que poderia ser impróprio se torna uma catarse digna de um fim quase inesperado. A cena de sedução dos personagens de Andie MacDowell e James Spader, com trilha eletrônica, é um primor de sutileza e delicadeza (veja abaixo). Dos melhores filmes que assisti nos anos 80 e está na minha lista de dramas favoritos de todos os tempos.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010
Lat Septem - 777

Não me pergunte as questões que levam uma pessoa a achar graça em andar de ônibus para ir ao trabalho. É um momento de solene desilusão quando se deixa acanhar pela monotonia. Mas, as vezes, o tempo é precioso e observar é colher experiência. Dependendo da situação, é possível obter inspiração suficiente para escrever. O texto abaixo é uma variação de outro só que em dois momentos distintos.
No sétimo dia do dia sete de julho – do mês sete – do ano de 2007, às 07 horas e sete minutos, entre os seis e oito segundo senti uma palpitação no coração quando estava sentado no ônibus que me levava para o serviço. Ela entrou com um sorriso tímido, os cabelos encaracolados caindo parcialmente em um dos ombros, uma bolsa de lona e um livro do Gabriel Garcia Marques em uma das mãos ("Amor nos tempos de cólera").
Passou pela catraca e sentou na cadeira em frente onde eu estava. Segui-a com carinho nos meus olhos e sorri de canto – num gesto de cumplicidade comigo mesmo. Claro, ela nem prestou atenção, aliás, não existo pra ela, sou mais um passageiro diário do ônibus de linha.
Ainda assim me permiti os excessos de poetas inconseqüentes que se apaixonam a cada dia e tentam galgar degraus absolutos do inalcansável para tocar sua musa.
Os óculos de grau, com aros vermelhos, lhe davam um charme intelectual e sua maneira simples e despojada de vestir me arremetia a desejos nostálgicos de amigas que dormiam aninhadas em meus braços, em busca de proteção no tempo de faculdade.
Contei então que ela possuía sete pontos chaves de que sua presença me instigava a interpelá-la e extrair um assunto simples para que a conhecesse melhor. Tarefa fácil. Mas, que nada. Na sua magnânima timidez ela me olhava rapidamente e logo voltava o seu interesse para o livro que carregava.
Ela se encolhia no canto da cadeira e o lia com dedicação. Por mim tudo bem, poderia ficar longos minutos lhe olhando sem que ela percebesse que eu via em suas feições e gestos àquela procura eterna da perfeição.
Um ponto: os cabelos castanhos, enrolados graciosamente, grandes, sinuosos e perfumados com algum shampo de erva aromática;
O segundo ponto: O olhar que aprofunda na leitura, mas vez ou outra escapa no tempo um olhar de procura em volta e nem percebe que o seu ato involuntário permite um flerte;
O ponto três: a pele alva, levemente sardenta;
Quarto ponto: aparenta uma delicadeza primaveril (como assim? Vão perguntar os decifradores de charadas), ou seja, com a cor das flores mais pueris de um jardim;
Olhaí o quinto ponto: sorri como a chama delicada de uma vela em um quarto à meia luz, numa noite de verão;
E o sexto ponto: caminha angularmente reta, compassada e arqueia o tronco levemente para trás, arrebitando sua puba enquanto os braços parecem delinear movimentos dançantes, milimetricamente dosado e...
Por fim o sétimo ponto: salvo engano, me trespassa com uma lança de paixão, com um olhar fulminante que me despe por inteiro e transforma minha paixão em desejo.
O que fazer com os seus sete pontos atrativos que me permitem borbulhar doses cavalares de glicose, daqueles arroubos idiotas que somente os apaixonados se permitem?
Apreciar, olhar e entender que no dia sete de julho de 2007 - passados sete minutos até o ponto onde eu ficaria – um pedido avulso às estrelas foi concretizado: vislumbrar a perfeição, tão assimétrica, das que ficam escondidas em alguma passagem de tempo que somente a física quântica permite em teoria científica.
Não sei o seu nome, não sei de onde vem e nem para onde vai... Mas de alguma forma eu sei que ela invade minha imaginação e ousa quebrar o encanto de minha desilusão quanto ao amor. Pois, de alguma forma, um novo amor faz esquecer um velho amor... Tão simples e óbvio quanto à vida monótona da realidade urbana que eu vivo.
Hoje, não tão só... Mas com você invadindo meus sonhos vez ou outra, sou um passageiro de ônibus tão feliz quanto inspirado...